Segue abaixo um artigo muito interessante do jornal Gazeta do Povo, no Caderno G, que mostra bem alguns pontos da diferença cultural entre Brasil e Alemanha.

 

Estudante alemã quer conhecer melhor Curitiba
e procura pessoas que lhe mostrem a cidade

 

Rudney Flores
especial para o Caderno G

 

"Quem gostaria de passear pela cidade de Curitiba e conhecer os seus arredores, fazer passeios e excursões, fazer amigos nos finais de semana?" Essa mensagem foi colocada em murais de avisos de algumas universidades da cidade pela estudante alemã Gesa Busche, que vai passar três meses fazendo um estágio no Instituto Goethe de Curitiba. Ela está à procura de pessoas que lhe mostrem a cidade.

Gesa conta que as pessoas que procuram novos amigos em seu país costumam fazer esse tipo de anúncio, publicando-os, inclusive, em jornais. Em Curitiba e no Brasil, talvez pela diferença cultural, a iniciativa pode causar estranheza e desconfiança, tanto que depois de uma semana, apenas duas pessoas se dispuseram a mostrar a cidade a ela.

O Caderno G teve conhecimento do bilhete afixado na Reitoria da Universidade Federal do Paraná e entrou em contato com a estudante para apresentar alguns pontos da capital paranaense. Numa manhã chuvosa de quarta-feira, Gesa pôde conhecer o Opéra de Arame e o Bosque Alemão, pontos turísticos da cidade, uma exposição da artista plástica Deise Marin no Museu Alfredo Andersen, o calçadão da Rua XV e também a Vila Pinto, área de população pobre, situada no bairro do Jardim Botânico. Suas impressões sobre a cidade podem ser conferidas no texto ao lado.

Gesa, que tem 22 anos, diz que escolheu o Brasil devido à diversidade. "Há muitos povos diferentes vivendo no país, muitos climas, várias espécies de plantas e animais. É uma mistura muito interessante", confirma. Ela teve notícias do país por jornais, revistas e pela Internet, além de uma amiga que trabalhou em São Paulo por um tempo e com a qual começou a aprender um pouco de português - língua que está aprendendo rapidamente.

Além da experiência pessoal, a visita ao Brasil vai ajudar no curso de Sociologia que está fazendo na Universidade Técnica de Dresden, sua cidade natal. Gesa já fez dois anos de curso e o trancou por seis meses para poder fazer a viagem ao Brasil.

Para chegar aqui, a estudante escreveu para os Institutos Goethe de todo o Brasil. Obteve respostas de três: Porto Alegre, Salvador e Curitiba. Acabou escolhendo o último, pois foi o único que ofereceu um estágio. Outro fator que pesou em sua decisão foi o clima da cidade, mais próximo do alemão. Seu trabalho até o final do ano no Goethe será o de ajudar a organizar concertos musicais e também auxiliar no serviço interno do instituto.

A alemã gosta muito de viajar e conhecer outros países. Já visitou boa parte da Europa e, há três anos, passou cinco meses trabalhando em uma casa de estudantes na Namíbia, no continente africano. Ela conta que a experiência foi um pouco difícil, principalmente pelo clima de apartheid que ainda acontece no país - uma herança da África do Sul, da qual se tornou independente em 1990.

Gesa espera receber ainda muitas respostas para o seu convite. Depois da temporada em Curitiba, a estudante pretende passar mais três meses viajando pelo país. Manaus, Salvador e Recife são algumas das cidades que pretende conhecer.

Alunos da Federal acham atitude corajosa

Um dos locais onde foi afixado o convite de Gesa Busche foi o prédio Dom Pedro I, na Reitoria da Universidade Federal do Paraná. Alguns alunos do local, em entrevista ao Caderno G, disseram que a estudante alemã teve uma iniciativa interessante e corajosa.

"Não sei se teria coragem de fazer isto se viajasse para exterior", revela Carlos Eduardo Chiquem, do curso de Turismo. Ele diz que não teria problemas em apresentar a cidade e que levaria a visitante aos principais pontos turísticos e ao seu bairro, Santa Felicidade, que tem colonização italiana.

Ulisses de Oliveira, que faz Medicina, conta que quando veio de Goiânia para estudar em Curitiba sentiu muitas dificuldades em fazer amizades. "Acho que para estrangeiros é mais fácil fazer este tipo convite", comenta.

Três estudantes de Letras, que não quiseram se identificar - "Somos desconfiadas" -, disseram que só aceitariam o convite se ele fosse feito de forma oficial, de um instituto alemão para um brasileiro. Se estivessem em outro país, também não arriscariam fazer a mesma proposta. "Imagine quem poderia aparecer", contam. Elas concordam que as diferenças culturais pesam muito nesses momentos. "O que pode ser normal em alguns países, não é em outros", completam.

 

Diferentes visões

Por Gesa Busche

"Minhas primeiras impressões sobre Curitiba são diferentes. Por um lado, penso que esta cidade não é muito diferente da Alemanha ou da Europa Central, porque tem muitos arranha-céus, um grande lado moderno, com um completo sistema de trânsito, algumas academias e três grandes universidades. Mas, por outro lado, eu experimentei diferenças de temperamento das pessoas de Curitiba e dos alemães que conheço.

Por exemplo, eu queria ir para o bairro Guabirutuba para comprar uma bicicleta usada. Primeiro, eu não sabia onde poderia pegar um ônibus que me levasse ao bairro. Quando eu soube de onde saía, o ônibus não chegava e eu aguardei por uma hora.

Como eu deveria trabalhar no Instituto Goethe mais tarde, tomei um táxi e com isso eu não me atrasei muito tempo. Quando encontrei o local, acabei não comprando a bicicleta, pois ela estava com os pneus vazios e não havia bomba para enchê-los.

Como não falo português muito bem, eu tive alguns problemas para voltar para o Instituto Goethe. Felizmente, eu consegui pegar um ônibus que me levou para o centro da cidade e eu pude saber onde eu estava.

Esta é uma diferença entre Curitiba e a Alemanha. Lá, há um planejamento nos horários dos ônibus e existem mapas explicando todo o trajeto das linhas. Não sei como é no restante do país, mas não vejo como negativo não haver tanta organização aqui, pois dessa forma abre a possibilidade das pessoas se comunicarem e improvisarem, ao contrário da Alemanha onde cada um segue seu caminho.

Um dos pontos que me chamou mais atenção na cidade foi o número de pobres nas ruas. Quando ando por uma cidade, eu gosto da mistura das pessoas, das diferenças na roupa, na altura, na cor do cabelo ou da pele - mas não da diferença social entre as pessoas, algumas com muito e outras com pouco.

Eu gosto muito dos parques. Eles trazem um ambiente de natureza para dentro da grande cidade. Também admiro as ofertas de academias para dançar, cantar, jogar ou tocar. São muito boas para mim.

O que se sobressaiu de simpático na cidade foi a grande hospitalidade e solicitude que uma estrangeira como eu pôde experimentar.

Monumentos de Curitiba como Ópera de Arame, alguns bosques, teatros ou ruas são iguais aos monumentos de outras cidades - belos para se contemplar.

Só queria lamentar os poucos espaços para as bicicletas em Curitiba, especialmente no centro da cidade."